terça-feira, 3 de abril de 2018

A verdade está lá fora


MUITOS SPOILERS! SE NÃO ASSISTIU TUDO E NÃO QUER SABER, SAIA DAQUI! 



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Era o fim de 2017. Numa preguiça muito mais forte que eu, procurava algo em que desperdiçar o tempo na frente da TV. Queria uma coisa divertida sem ser pateta e meio tosca para eu não esquecer o quanto sou besta. Já tinha assistido a todos os episódios de The Walking Dead, então abri o diretório de séries do Now e deixei a vida me levar (por que não fui para a Netflix? Ora, estava com preguiça de pegar o computador). Num tédio digno de pena, fui passando de nome em nome sem me prender a nada, cogitava desistir e procurar algo de útil para fazer quando, voltando à primeira página, vi a sugestão de algo familiar, mas muito, muito antigo e que eu gostava bastante quando adolescente, até onde me lembro aquele protagonista foi um dos meus celebrity crushs do começo da adolescência. Provavelmente não tinha assistido tanto quanto gostaria, afinal, nos anos 90, TV paga e internet eram luxos que a gente conhecia o suficiente para saber que existiam, mas não eram para todo mundo, muito menos para mim.

Foi assim que comecei a maratonar Arquivo X. Logo no primeiro episódio tive a certeza de estar diante de algo que jamais iria ao ar agora e, justamente por isso, adorei o que vi. Os protagonistas eram humanos demais, nenhum dos dois tinha aquela perfeição exigida pelas câmeras HD, 4K, ou seja lá o que for, do século XXI. As roupas oversize, o cabelo meio estranho dela (alguém lembra do penteado usado num encontro no 3º episódio? Pois é, eu lembro), o jeito nerd/bom moço/maluco dele. Gostei da escolha dos atores que, embora atraentes, não ostentavam aquela beleza inalcançável que vemos todo dia. Ela tinha sardas e o nariz idêntico ao da minha mãe, ele, nenhum músculo definido e um andar desajeitado que me fez rir muitas vezes. Hoje, Dana Scully seria Scarlett Johansson e Fox Mulder, um dos irmãos Hemsworth (provavelmente o Liam).

                       Resultado de imagem para arquivo x 1ª temporada
         


Desde que comecei a escrever ficção, construção de personagens é algo que me fascina. Entendo que a trama é uma boa desculpa para mostrar quem são eles. Enfim, foi fantástico conhecer um cara obstinado, sarcástico e disposto a acreditar em duendes, ET's, bruxas, fantasmas, vampiros, vudu, teorias conspiratórias e qualquer coisa que supostamente uma tribo de nômades do deserto acreditou 5.000 anos atrás, trabalhando com uma médica, mestre em física, cristã, orgulhosa de seu rigor científico e ceticismo. Logo de cara, um episódio com direito a exumação de cadáver não humano, abdução de adolescentes e um garoto em coma correndo em fuga pela rua, isso além de termos a Scully mostrando o corpinho para o Mulder com a desculpa de querer saber que marca era aquela (não julgo. Eu, provavelmente, faria o mesmo).


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Como não amar os anos 90?

Daí vão se seguindo episódios cheios de ação, mistério e efeitos especiais constrangedores, onde a lealdade e amizade dos dois vai crescendo a cada caso. Logo descobrimos que existe uma conspiração maior que a obsessão de Mulder em encontrar a irmã abduzida na infância. A dupla vira shipp na segunda temporada, depois da abdução dela, mas o relacionamento segue platônico por muitas temporadas, para alívio de quem já viu outras séries de ação perderem o rumo ao transformar seus protagonistas em casal cedo demais. A coisa vai muito bem, temos no “Smoking Man” um vilão para odiar sem ressalvas; no Krycek, um antagonista menor para nos confundir, um aliado duvidoso no Skinner, o núcleo cômico nos Pistoleiros Solitários, doses de drama, parentes mortos, doenças incuráveis, humor, mistério, ação e uma mitologia meia boca, que convence e atrai.

                              

A coisa começa a ficar estranha entre a sexta e sétima temporadas, especialmente depois que ele descobre que a irmã morreu ainda nos anos 70, que os pais sabiam da treta e que é filho de seu arqui-inimigo (Luke Skywalker feelings), Scully descobriu e perdeu uma filha num arco de dois episódios, se descobre estéril e a química entre os dois começa a sair das entrelinhas. A sétima temporada acaba com Mulder abduzido e Scully grávida, um novo agente difícil de engolir, Skinner naquela postura “não sei de que lado vou ficar, por enquanto, fico em cima do muro levando pedrada de todo mundo”.


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A 8ª temporada serve para nos mostrar que não importa quantas criaturas e luzes estranhas a série tenha, nem o quão durona a Scully seja correndo e dando porrada de salto alto, sem o Mulder atrevido, insubordinado e crente no improvável,  a série não se sustenta. Pois bem, ele volta nos últimos episódios, resolve a coisa toda, Smoking Man e Krycek estão mortos, os extraterrestres prometeram deixar William (o filho da Scully) em paz, os Pistoleiros fazendo as vezes de reis magos e um beijo tão fofo entre os dois, que eu queria guardar num potinho (sim, eu tenho coração).


Podia ter acabado a série por aí. David ia correr atrás da carreira no cinema que desejava, o spin off dos Pistoleiros seguiria, todo mundo ficaria feliz. Mas Chris Carter se recusou a sacrificar a galinha dos ovos de ouro e lá fomos nós para a 9ª temporada, sem Mulder, Scully quase sempre fora de ação e a tentativa patética de repetir a química dos primeiros protagonistas com Mônica e John.  Mesmo assim, a coisa se arrastou, pegando algum embalo nos últimos cinco episódios, com a morte dos Pistoleiros, a adoção de William, o julgamento de Mulder e uma data para o fim do mundo: 22 de dezembro de 2012. Tiro porrada e bomba, temos a última cena cheia de incertezas e alguma esperança.

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A partir daí, o caldo entorna de uma vez por todas (sim, eu vou ignorar o segundo filme). Anuncia-se a 10ª temporada, anos depois e com os mesmos atores, numa continuação da trama bem longe de onde ficou em 2002. Por que não fizeram isso em 2012, quando a humanidade deveria ser extinta, o mundo estava histérico, era a data que eles receberam na 9ª temporada e ainda não dava pena ver o David Duchovni correndo? Nunca vamos saber. A série está irreconhecível e os personagens perderam muito do que os fez interessantes lá em 1993. Admito que a crise existencial e os perrengues nesse mundo novo foram divertidos de ver por um ou outro episódio, mas não justificaram a volta de uma série icônica e tão querida. Aliás, alguém me explica por que a Mônica virou babá do Smoking Man? A 11ª até teve seus momentos dignos dos anos 90: destaque para o episódio em que eles encontram William pela primeira vez e o futurista, Rm9sbG93ZXJz, com ares de Black Mirror e uma premissa mal aproveitada, mas que rendeu um bom entretenimento.

                                    


Na noite passada, assisti ao último episódio, com semanas de atraso e o coração na mão. Podia ser a cereja do bolo ou o prego no caixão. Deu muita saudade da Scully das primeiras temporadas, que deu lugar à mulher quase submissa, que fica em casa dando telefonemas enquanto deixa o parceiro correr o país atrás do filho que todo mundo quer matar, inclusive ele mesmo. Moleque chato! “Ain, tenho super poderes e uma ligação mental com a minha mãe biológica, então vou ter duas namoradas, brincar de fazê-las matarem uma à outra e nunca vou deixar a mulher me ver, because reasons.” O mimadão sabia o quanto a mulher queria encontrá-lo mas preferiu brincar e fazer cosplay de Mulder quando ela teve a chance de falar com ele. Quero suprimir a memória do Mulder perseguindo o menino adolescente na plataforma. Eu não sei se era o personagem ou o ator, mas alguém ali estava à beira de um enfarto. Aí o floquinho de neve, também conhecido por William Scully/Jack Van de Kamp, encara o Smoking Man, ainda usando a imagem de Mulder e leva um tiro na testa no lugar do pai/meio irmão. Mulder atira no vilão e o cara morre. Claro, o míssil não deu conta em 2002, mas três tiros do Fox são capazes de derrubar até o Drácula. Para acabar com a coisa toda, ao ver o filho morto, Scully vem toda na base da atitude “também, nem queria esse aí, não era meu, nem deveria existir” e Mulder de repente vira o pai do ano, declarando que não sabe ser outra coisa que não, pai. Deixa ver se entendi: você passou dois dias com o menino quando ele nasceu, 17 anos depois, gastou horas perseguindo o rebento só porque ela mandou e agora vem dizer que não sabe ser outra coisa? Pode até ter pensado no assunto e sofrido por isso, afinal você é Fox Mulder, o bom moço mais bom moço da ficção científica, mas o que você foi nos últimos 57 anos, amigão? Uma samambaia? Aí ela vem com a solução mágica: “mas você é pai!” E coloca a mão dele na barriga. Lindo! A mulher tem 53 anos, os óvulos todos foram removidos em 1994, dessa vez ninguém estava usando a infeliz de cobaia e ela engravida sem querer. Para quebrar o cima de Maria do Bairro, temos nos últimos segundos, William saindo da água com a testa furada, no melhor estilo supersoldado.

Sério, Chris Carter, Fox, ou quem mais possa decidir. A galinha dos ovos de ouro que vocês não quiseram matar, morreu de velhice, é um zumbi inconveniente se alimentando do sucesso que marcou uma geração e mudou a TV para sempre. Atira na cabeça e deixe a coitada descansar em paz. Não faça mais um filme, não tente spin off, não continue com Miller e Einstein. Deixa pra lá. Da minha parte, vou ficar com o final da oitava e fingir que o resto foi fanfic. 

2 comentários:

  1. Concordo 100% com o que você disse, eu achei o jeito que eles voltaram com a série meio forçada, parece que relembraram que a série na época fez sucesso e acharam uma boa ideia trazer ela de volta, mas pelo menos teve uns momentos legais, mas poderia ter acabado na nona temporada mesmo. Ao todo achei a série incrível, não é como qualquer uma, ela tem seu jeito único de ser.

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    1. Verdade, Vinicius. Essa série é única e mudou a história da TV. Recomendo sempre

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